sábado, 24 de outubro de 2009

O poder da amizade

[Novas pesquisas mostram que seus amigos – e até os amigos dos amigos de seus amigos – podem fazer você mais rico, mais feliz, mais magro, mais saudável...
David Cohen e Marcela Buscato. Com Andres Vera, Martha Mendonça e Peter Moon]

A ideia de que os amigos exercem influência sobre nós tem pelo menos 3 mil anos. É mais ou menos dessa época o registro de um ditado assírio: “Diga-me quem são seus amigos e eu direi quem você é”. (Que um ditado similar – “Diga-me com quem andas...” – seja comum no Brasil mostra quanto essa percepção resiste ao tempo e às diferenças culturais.) Mas só agora começamos a entender até onde a influência de nossos amigos se estende – é para bem mais longe do que supúnhamos.
Para o filósofo grego Aristóteles, um dos patriarcas da sabedoria ocidental, amizade era “uma única alma habitando dois corpos”. Ou, como disse o filósofo e político romano Cícero, três séculos depois, ter um amigo é ter um segundo eu. A escritora francesa Anaïs Nin definiu o mecanismo dessa influência de forma poética: “Cada amigo representa um mundo em nós, um mundo possivelmente não nascido até que ele chegasse, e é somente através desse encontro que um novo mundo nasce”. Com um pouco menos de poesia e um tanto mais de senso prático, milhões de pais compartilham essa opinião. E tratam de averiguar em que companhia andam seus filhos adolescentes – justamente por medo de que aflorem neles alguns mundos estranhos a seus valores.
É tão arraigada a noção de que as amizades ajudam a definir nossos caminhos na vida que um dos mais bem-sucedidos livros de autoajuda de todos os tempos (15 milhões de cópias vendidas no mundo inteiro) carrega o sugestivo título de Como fazer amigos e influenciar pessoas. Escrito em 1936 pelo palestrante motivacional americano Dale Carnegie, o texto resiste até hoje como um manual para se dar bem na vida. Mas finalmente está se tornando desatualizado.
Uma série de pesquisas começa a mostrar que o poder da amizade é bem mais amplo do que imaginamos. De acordo com dois pesquisadores americanos, não somos habitados apenas pelos mundos criados por nossos amigos. Temos dentro de nós também os mundos criados pelos amigos dos nossos amigos e pelos amigos dos amigos dos nossos amigos. Os argumentos deles estão no livro Connected – The surprising power of our social networks and how they shape our lives, recém-lançado nos Estados Unidos (a edição brasileira, O poder das conexões – A importância do networking e como ele molda nossas vidas, deverá ser lançada no dia 25 de novembro, pela editora Campus-Elsevier). A conclusão é desconcertante. Nosso comportamento é moldado, em boa medida, por gente que nem sequer conhecemos, da qual estamos afastados por 2, até 3 graus de separação. “Nosso ponto principal não é tanto mostrar que seus amigos o afetam. Isso é senso comum. Nós mostramos como pessoas que não conhecemos nos afetam”, diz o médico e sociólogo Nicholas Christakis, professor da Universidade Harvard e coautor do livro, junto com o cientista político James Fowler, da Universidade da Califórnia em San Diego (
leia a entrevista)
Por mais surpreendente que pareça esse contágio, não é difícil encontrar evidências dele. Em 2001, o empresário paulistano Luis Carlos Cabernite viu um grupo de golfistas no aeroporto, indo para Punta del Este. Como ele também ia para lá, visitou o campo. Encantou-se e, de volta a São Paulo, começou a fazer aulas de golfe. Seu entusiasmo atraiu o irmão, Paulo. Paulo “contaminou” a namorada, Adriana (hoje sua mulher), e o amigo José Mauro Gabriolli, um publicitário. “Há uns três anos, fui ver o Paulo num torneio e decidi experimentar”, diz Gabriolli. “Não parei mais. Agora estou tentando trazer minha mulher.” Ele adquiriu um hábito semanal influenciado por Paulo Pimentel, um desconhecido – o organizador da turnê de golfistas que encantou o irmão de seu amigo.
Da mesma forma, a empresária carioca Marcella Tcheh, atleta convicta desde os 15 anos, influenciou sua irmã, Jullie, a fazer ginástica numa academia. E Jullie levou para a ginástica uma vizinha, a publicitária Ana Paula Perissé. O processo também ocorreu com um grupo de ciclistas de São Paulo. A analista de sistemas Flávia Grohmann convidou a colega de trabalho Cristiane Fogaça para participar de uma trilha de bicicleta. Cristiane chamou o marido, Marcelo Castro, e Marcelo levou sua irmã, Ana.
É provável que todos tenhamos não uma, mas algumas histórias desse tipo em nossa vida. Só não percebemos a influência dos desconhecidos porque, bem, eles são desconhecidos. Quando Fowler e Christakis analisaram estudos com dados de milhares de pessoas, ao longo de quase 50 anos, esses laços ficaram mais claros. Eis algumas de suas descobertas.
“Nosso ponto não é que seus amigos o afetam. Isso é senso comum. Nós mostramos como desconhecidos nos afetam”

Para mais informações e visualização de imagens, acesse Revista Época.

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